Sobre o romance

Por Alexey Dodsworth, roteirista.

Há várias formas de contar uma história, e uma de minhas favoritas é através dos quadrinhos. Quando a ideia de SAROS 136 me veio à mente, a proposta inicial era a de um romance textual. Um livro. Mas, à medida que a história se desenvolvia, fui me dando conta de que as imagens eram poderosas demais e que, por isso, a aventura seria melhor transmitida se eu a contasse na forma de um filme ou de uma história em quadrinhos. Quadrinhos têm uma vantagem sobre filmes: não precisamos gastar tanto, e um filme que contasse a história de SAROS 136 demandaria efeitos especiais custosos.

Após um jantar com Raphael Fernandes, um de meus editores favoritos, chegamos à conclusão de que tínhamos, sim, uma história em quadrinhos a ser contada. Daí para pensarmos em Ioannis Fiore como o desenhista que transformaria o roteiro em imagens, foi um passo. Para nossa alegria, ele topou. E a alegria se multiplicou quando, em 2020, a nossa proposta foi uma das vinte selecionadas pelo Programa de Ação Cultural da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo. 

SAROS 136 é a história de quatro pessoas separadas no tempo, sem - aparentemente - nada em comum entre elas, além do fato de que todas em breve irão testemunhar um eclipse total do Sol. Este é o tipo de enredo que eu mais gosto de desenvolver: um cenário em que temos não um protagonista, mas vários, cada um com seus dramas particulares e seus problemas. 

Em SAROS 136 você torcerá por António, um angolano que não aceita ser escravizado e fará de tudo para reaver sua liberdade. Você acompanhará Heinrich, um astrofísico inglês que viajou para o Ceará com a finalidade de verificar uma teoria de Albert Einstein. Você testemunhará os esforços da astronauta brasileira Julia para salvar uma base lunar. E se emocionará com Radha, uma geneticista indiana que, com o pouco que tem, tenta salvar as pessoas no último refúgio da humanidade no planeta Terra. Todos com problemas a resolver. Problemas individuais, problemas coletivos. Dramas pessoais, conflitos científicos, tendo como pano de fundo o fato de que o dia, por alguns minutos, virará noite.

"E de onde veio o nome da história?", você pode estar se perguntando. Pois bem: "saros" é um termo astronômico utilizado para descrever ciclos de eclipses. A cada dezoito anos, onze dias e oito horas, ocorre um eclipse (solar ou lunar), de modo que é possível prevê-los com bastante antecedência. Pode experimentar: pegue a data de um eclipse qualquer e conte dezoito anos, onze dias e oito horas para a frente ou para trás, e você encontrará outro eclipse. 

Existem vários ciclos saros e cada um deles recebe um número. O que os eclipses do ciclo saros de número 136 têm em comum é que, quando eles ocorrem, o Sol, a Terra e a Lua retornam para uma posição em que a geometria relativa é aproximadamente a mesma. Quatro (ou dez, ou vinte) eclipses saros que tenham o mesmo número são, por isso, ao mesmo tempo "o mesmo eclipse"... embora, claro, não sejam o mesmo, já que os anos são diferentes.

Dito isso, é preciso dizer que nossa história em quadrinhos tem um quinto protagonista, mas ele não é uma pessoa. É o eclipse. E esta é uma das coisas que caracteriza a ficção científica: em contos do tipo, um problema científico é o elemento disparador. É tão importante e significativo que se torna um personagem!

Eclipses me fascinam desde que me entendo por gente. A existência de eclipses demanda uma dinâmica curiosa, singular, característica de nosso planeta, em que o disco do Sol e o disco da Lua têm o mesmo tamanho aparente, apesar de seus tamanhos reais serem tão diferentes. Fosse a Lua menor (vista a partir da Terra), jamais teríamos um eclipse total do Sol. 

Em torno de eclipses, culturas desenvolveram narrativas míticas e tentativas de explicação. E se hoje já sabemos tudo o que há para saber a respeito do fenômeno em si, ainda há muito para ser contado. Histórias de pessoas e civilizações que foram impactadas pelo fato de que, às vezes, o Sol é devorado pela sombra da Lua.

SAROS 136 estará em breve nas livrarias e em várias bibliotecas públicas. Espero que vocês curtam ler tanto quanto eu me diverti criando!


Design: Studio Del Rey.

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